Napoleão funciona como comédia, mas decepciona como épico histórico
Por Pedro Belaine
Uma das figuras mais carimbadas em adaptações para o cinema talvez seja Napoleão. Como personagem marcante na história e na cultura, por suas peculiaridades difundidas pelo mundo, em sua maioria sem o menor embasamento histórico. Com a proposta de um filme para a Apple TV+ com mais de 4 horas de duração, Ridley Scott promete um épico histórico, mas critica a busca por veracidade na trama e entrega para os cinemas um filme completamente em retalhos que tenta se sustentar através do humor, porém se perde no seu personagem principal, destoante e desconexo, que nada honra o título de imperador que tanto é proclamado no filme.
O material de Napoleão, que foi vendido ao longo dos meses de divulgação, entregava uma história potente, um épico digno do que o diretor tem costume e sabe fazer. Não é justo dizer que no filme essa parte esteja de fora; por sinal, a cena final (A Batalha de Waterloo) me lembrou muito a cena da batalha do episódio “Batalha dos Bastardos” de Game Of Thrones, em uma escala maior e com dinâmica bem mais realista. Mas a realidade é que a maioria do tempo o filme está contando outra história, acompanhando as cartas de Josefina para Napoleão, com pouquíssimos vislumbres do momento político que vivia a França e muito menos a força do Imperador como um guerrilheiro e estrategista.
Joaquin Phoenix aqui parece se divertir no papel, mas não condiz com a narrativa que está sendo contada. A realidade é que aparentemente a abordagem que ele deu ao personagem não se conectou com o resto das atuações e acabou destoando do resto da trama. E aí eu tenho que apontar o dedo; Ridley Scott deveria ter tido mais coragem e ido de cabeça em uma comédia, mas foi refém do seu estilo e, ao tratar o filme como um épico histórico, não funcionou para mim.
Como maior problema, sem dúvidas, a montagem é péssima. Talvez porque o corte original tenha 4 horas e seja essa versão para a qual o diretor se planejou de fato, mas é incontável as vezes que eu precisei parar e me perguntar quem é tal personagem ou “Como assim já passaram 15 anos?”. Em um segundo ato sofrível de arrastado, a sua confusão é tanta que aparentemente até certos personagens são esquecidos nesse corte de 2h38min, tornando uma experiência passível de pescar por um momento e perder alguma passagem repentina de tempo.
Fiquei decepcionado porque, apesar de não querer fidelidade histórica, eu gostaria de um bom filme. Existem bons diálogos e nos momentos em que o filme escolhe não se levar a sério, consegui soltar aquele famoso ar pelo nariz. Para mim, não há química entre Vanessa Kirby e Joaquin Phoenix, e falando nela, sua personagem é a que mais possui uma construção dentro da narrativa e um equilíbrio da atriz em sua atuação.
Sou a favor do diretor ter a liberdade que for necessária. Provavelmente, assistirei à versão de 4 horas que espero unir as pontas que parecem ter sido abruptamente cortadas e dar liga nessa bagunça que foi Napoleão. Não vou dizer que o filme é ruim; existe um excelente trabalho que apenas não é a obra completa que Ridley Scott quer apresentar ao espectador. Mas assistindo apenas às 2h38min, devo dizer que foi maçante, cansativo, cômico e, em breves momentos, épico. Se você quer assistir baseado na experiência dos trailers, vai se decepcionar.